É certo, como foi dito, que o acaso existe. Mas, mais certo do que isso, é que em inúmeros casos – especialmente nos mais inusitados e estranhos –, em que atribuímos sua origem a uma causa aleatória e fortuita, o que ocorre de fato é que desconhecemos por completo essa origem e, por falta de humildade talvez ou quem sabe por uma simples incapacidade de lidar com a incerteza, afirmamos e nos convencemos de que realmente não há uma causa para aquilo cuja razão ignoramos por completo – e isso, dizemos, só pode ser obra do acaso.
Alguns motivos podem ser apontados para esse viés em nossa percepção. Um deles, creio, reside no fato de superestimarmos (ainda que inconscientemente) nossa capacidade cognitiva. Assim, igualamos aquilo que podemos compreender àquilo que é inteligível, tornando – para nós , em nossa percepção – impossível algo que não podemos conceber nas condições atuais de nosso intelecto. Nossa mente, ou ao menos a da maior parte de nós, acomoda esse viés como se ele não existisse.
Outra razão para chegarmos a um veredito falso acerca das causas de determinado evento é a necessidade de termos controle das situações em que estamos envolvidos. Por algum motivo, a randomicidade não é bem aceita e, embora ela exista na vida real, tendemos a extirpá-la de nossas consciências. Assim, para evitar manter em nosso escopo mental um elemento desconhecido, nosso cérebro trata-o como inexistente. Reduzimos, portanto, nossa visão de mundo a um esquema cuja compreensão imediata esteja ao nosso alcance desde já.
Com isso, tendemos a ver o mundo tão-somente em seu aspecto puramente material, ignorando as causas ocultas que fazem parte de nossas vidas. Relegamos ao acaso efeitos que não podemos compreender com nossos sentidos primários. Deixamos de pensar sobre uma vasta e incomensurável imensidão de temas cujo aprendizado pode nos engrandecer.
Quanto mais reduzido é nosso mundo, maiores nos tornamos relativamente a ele. Adquirimos sapiência cada vez maior, de um universo cada vez menor. Tornamos-nos soberanos de um reino que, na verdade, não passa de uma pequena e singela casca de noz.