O Ingênuo

O Ingênuo nascera e crescera com pureza no olhar. Aliás, também no ouvir. Era um sujeito simples, de hábitos frugais. Um passeio demorado em local desconhecido era das atitudes mais extravagantes a que se permitia.

O Ingênuo não era apenas ingênuo, mas muito esquisito também. Quando diante de um sorriso, vejam só, somente podia inferir disso uma expressão simpática. Falsidade? Que sentido haveria nisso? Por que alguém haveria de transparecer algo que é o oposto do que sente? Outra esquisitice: quando lhe diziam algo, não é que interpretava como se lhe estivessem querendo dizer exatamente o que falavam? Que sujeito estranho! Dava às palavras o significado que elas possuíam.

Ah, esse Ingênuo. Quantos “não sei” já ouvi saírem de sua boca. Faltava-lhe sabedoria para preencher assuntos que desconhecia com palavras que agradam a qualquer ouvinte. Que sujeitinho simplório! Tinha a tola mania de ser sincero. E de não ostentar conhecer além do que sua consciência apreendera em sua vida.

– Que mal há de me imputarem apenas por dizer a verdade? Como pode a sinceridade ser ofensiva, se não se trata de juízo de valor e tão somente de replicar em palavras algo que em si já é? – assim pensava ele, tão tolo o pobre coitado.

Somente alguém muito prepotente para crer-se de posse da verdade; e ainda por cima querer espalhá-la. É, a soberba deve ter tomado conta do Ingênuo.

Com que autoridade pensa poder chamar o azul de azul e o amarelo de amarelo? Quem pensa que é para dizer que após a noite enluarada sucederá um novo dia? E que a chuva irá dar de beber às plantas, jorrando-lhes vida?

 

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