O Peregrino

De uma terra distante veio o Peregrino, cujo mapa com a indicação do caminho de volta para casa está guardado nos recônditos de sua alma. Tão remota era sua terra natal que mesmo as estrelas mais afastadas pareciam próximas se comparadas a ela. E cá estava ele, vivendo sua vida, embora ansiando sempre por regressar à pátria amada. Uma pátria de que ninguém ouvira falar, mas cuja existência lhe era certa. Ele próprio já não lembrava mais como era o lar que sempre o acolhera e de onde viera, o que não abalava, no entanto, a certeza de ter uma casa para retornar após a longa jornada da vida.

Olhava ao redor, em sua atual morada, e a sensação de que dali não fazia parte era permanente. Mesmo que tentasse, jamais poderia encaixar-se por completo num mundo que não é o seu. Como fora parar ali é uma história que ficou esquecida; que foi paulatinamente apagada das memórias daqueles que um dia dela souberam.

E assim, o que era realidade virou mito. E o mito foi esquecido.

Mas nada desaparece por completo sem deixar vestígios; toda história deixa traços de seu curso, ainda que seus rastros sejam por demais sutis. E, como foi dito, o mapa que guarda o caminho de volta para casa encontra-se nos recônditos da alma do Peregrino. E assim como ele, aqueles que almejam retornar à pátria de origem, devem dar ouvidos às vozes de suas almas – única maneira capaz de acessar o mapa que se encontra tão perto e ao mesmo tempo tão inacessível.

Da infinitude de caminhos que se lhe apresentavam, mesmo os mais atraentes e prazerosos, somente um parecia preencher seus anseios mais profundos: o caminho de volta para casa. Ainda que nem sempre os rumos que o conduziriam de volta à pátria esquecida fossem claros, aqueles que desembocavam em direção oposta eram facilmente detectáveis, pois sua alma sempre os rejeitava, ainda que sua mente por vezes buscasse ocultar tal rejeição.

E quando percebeu que o caminho oculto poderia ser revelado, a angústia deu lugar à esperança; e o inverno, à primavera.

(Continua…)

 

Sê aquilo que és

Olvidaste aquilo que já te foi mais caro. Puseste em dúvida aquelas que já foram tuas maiores convicções. Encaraste como novo o que sempre foi de teu conhecimento. E agora vês o sonho como realidade.

Mas eu te digo: sonâmbulos são aqueles que passam os dias a tratar dos assuntos da matéria, sem atentar para as coisas da alma. Iludidos estão aqueles que pensam que a vida começa ao nascer.

Por isso, te suplico: rasga o véu que te ilude, e lembra de quem és. Lembra que há nos sonhos, verdade. E que aquilo que vês como verdade, não passa de um sono profundo. Portanto, acorda. Abre teus olhos, e com eles teu coração. Liberta tua alma. Sê aquilo que és.

Uma pequena fagulha

Quanto mais longe projetamos nosso olhar, mais brilhantes se tornam nossos olhos.

E o brilho de um olhar é uma expressão de vida; é uma fagulha cintilante.

O brilho de um olhar é a faísca de uma alma resplandecente.

E somente resplandece a alma que carrega em si um coração que reluz.

Reluzente é aquele coração que pulsa não para si, e sim para aqueles que dele precisam.

É aquele que a cada pulso vibra um nobre sentimento, espalha o amor.

E o amor, quando espalhado, transforma o coração numa tocha cintilante.

Dessa tocha, lançam-se faíscas que ao se encontrarem com outros corações flamejantes, acendem outras tochas que espalham o brilho do amor.

Acendamos a tocha que há em nosso peito. Recobremos o brilho no olhar.

Espalhemos esse brilho. Façamos de nossos caminhos mais claros e aprazíveis.

Que a mais profunda Paz e o mais puro Amor invadam nossos corações e deles transbordem, espalhando-se àqueles a nossa volta.

Humildade e verdade

Evoluir é não somente adquirir e aprimorar virtudes, mas também despojar-se daquilo que nos impede de alçar voos mais altos. E o primeiro dos passos que leva ao despojamento é a humildade. Com ela, deixamos de ostentar convicções momentâneas e nos abrimos para as verdades eternas.

Não há caminho que leve a uma melhora interior que não passe pela superação. E a superação somente é possível quando reconhecemos aquilo que é preciso melhorar. Daí a importância da humildade. Daí a importância de deixarmos vaidades de lado e nos olharmos com sinceridade.

E o olhar sincero requer honestidade, pois quando deixamos de ser honestos conosco mesmos já não somos mais sinceros também. E a mentira não deve ter lugar em nossos pensamentos e sentimentos se o que almejamos é a verdade.

E se ainda não somos capazes de ver-nos tal como somos é porque ainda temos muito do que nos despojar. É preciso despir-nos da fantasia que oculta nosso eu. É preciso deixar para trás, e somente para trás, tudo aquilo que não é verdadeiro, e também tudo aquilo que nos impede de sermos pessoas melhores a cada dia, a cada instante.

Olhar para dentro de nós não é tão fácil como pode em princípio parecer, mas é algo revelador, capaz de dar-nos nova perspectiva das coisas; capaz de abrir-nos a um novo mundo, eternamente existente mas há muito esquecido.

Dentro de nós existe um segredo

Dentro de nós existe um segredo, velado pelo esquecimento de vidas e vidas. Dentro de nós estão as chaves do auto-conhecimento. Dentro de nós estão registradas nossas histórias; estão gravadas as respostas para as perguntas que esquecemos de nos fazer.

Quem é capaz de ver a si mesmo, depara-se com um vasto mundo, tão familiar quanto desconhecido. Familiar pois nosso mundo interior é o que de mais verdadeiro podemos encontrar nessa vida; é a nossa história tal como traçada desde o nascimento de nossas almas. Desconhecido pois o sucessivo nascimento em corpos de matéria ao longo de eras quase que apagou-nos por completo a memória de nós mesmos; de nossas almas.

Mas o que somos não pode ser apagado jamais. Nossa verdadeira história cedo ou tarde virá à tona; um dia retomaremos a consciência de nós mesmos, e esse dia será breve. O dia em que aprendermos a ouvir a voz de nossas almas reconheceremos um som que é o nosso próprio som; uma “voz” que é a nossa verdadeira voz.

E nesse dia um universo tão vasto terá se aberto diante de nós que a única saída será desbravá-lo. E eis o caminhar da espiritualidade; eis o caminho do auto-conhecimento. Eis o início da mais verdadeira das jornadas: a jornada interior.

Além das estrelas

Lembremos do local em que vivemos, esse pálido ponto azul chamado Terra, e da imensidão de tudo que existe. Diante desse contraste, ajustemos nossa perspectiva das coisas. Em relação à vastidão das galáxias e galáxias e de todas as estrelas que delas fazem parte, todo e qualquer problema de nossas vidas parece ínfimo.

Voltemos nossos olhares para as estrelas e além delas; sejamos capazes de vislumbrar aquilo que nossos olhos não permitem ver. Fazendo isso, expandimos nossas consciências. Libertamo-nos do confinamento que aprisiona nossas mentes às coisas tolas do dia-a-dia. Somos libertos das preocupações que nos impedem de ver as soluções para os problemas. Podemos ver um novo horizonte, totalmente diferente daquele que se apresenta diante de nós.

Nosso pensamento pode ir tão longe quanto permitirmos que ele vá. Para isso, basta romper os pensamentos e sentimentos que agrilhoam nossas almas. Esses grilhões, contudo, são tão fortes quanto sutis – e essa sutileza os torna eficazes, pois somos aprisionados sem que reconheçamos assim estar; e isso nos impede de lutar contra essa prisão.

Se ainda não estamos plenos, é porque algumas dessas armadilhas ainda nos prendem e, por isso, devemos lutar. Lutar para sermos conscientes, sabendo o porquê de nossas vidas. Lutar para que nada que não seja Amor, Bondade, Paz, Coragem, Justiça, Sabedoria e Serenidade pulse em nossos corações.

Devemos voltar nossos olhares para cima, ver o brilho das estrelas e vislumbrar o que há além delas. Devemos elevar nossos sentimentos e vibrar a cada instante aquilo que de mais puro possa sair de nós.

Viver uma vida consciente é uma missão a ser cumprida, e devemos nos conscientizar disso. Esse é um passo enorme, e o primeiro de muitos que permitem enxergar o que há além das estrelas.

Meditar é preciso

Considerar os porquês que influem em nossas vidas, voltar-nos um pouco para o aconchego de nós mesmos, refletirmos sobre acontecimentos que defluem automaticamente, buscar as causas mais profundas de cada situação são atitudes que levam a uma vida mais consciente.

Levam-nos, por vezes, a perguntas irrespondíveis. Mas a busca por consciência já é em si uma atitude consciente. O caminho da espiritualidade é um percurso eterno em que o fim de uma etapa é o início de outra. Por isso esse deve ser um caminhar despretensioso, sem que o trilhemos para atingir uma finalidade específica, mas que percorramos as sendas espirituais simplesmente porque, de algum modo, sabemos ser esse o caminho mais repleto de sentido e também o mais verdadeiro.

Estarmos dispostos a começar tudo de novo tantas vezes quanto necessário, a revermos nossa forma de ver o mundo, despojarmo-nos de velhas concepções profundamente arraigadas, estarmos prontos para esquecer o passado que não contribui para que o presente seja erigido à maneira que queremos são posturas internas que devem ser inequívocas na alma daqueles que buscam consciência em suas vidas.

Meditar em profundidade e, sobretudo, com honestidade é preciso. Um mergulho profundo, obstinado e sincero em direção a nós mesmos é capaz de romper as cascas que nos impedem de ver quem realmente somos. Leva-nos àquilo que devemos ser; transforma-nos naquilo que nascemos para ser: simplesmente nós mesmos, em plenitude, despojados de tudo que não seja harmônico, pacífico, belo, justo, correto e permeado pelo verdadeiro amor.

Eu acredito

Eu acredito em mágica. Acredito que sonhos não são só sonhos. E acredito no poder da imaginação.

Confio no poder da fé; e na realização do impossível.

Penso que acreditando crescemos. E que uma crença viva é como uma janela aberta.

E uma janela que se abre é um convite à descoberta, ao conhecimento de algo novo.

Aprendendo coisas novas, mudamos. E a mudança é a tônica da vida. Nada permanece eternamente o mesmo.

A vida é um pulsar; é movimento. E estando abertos ao novo, de corpo e alma, estamos nos movimentando.

Redescobrimo-nos a cada instante, e não nos contentamos com nenhuma situação permanente.

Evoluir é mudar; e mudar é romper padrões. É ter humildade e traçar novos caminhos.

E para trilhar caminhos verdadeiramente novos, é preciso crer que eles existam e sejam possíveis de se percorrer.

Nossa maior limitação é o limite daquilo que podemos acreditar.

Pequenos gestos

Pequenos gestos são capazes de provocar grandes mudanças. Um simples sorriso ou uma palavra gentil são hábitos que, incorporados ao dia-a-dia e usados em abundância, podem causar boas surpresas.

As pessoas ao nosso redor são como espelhos que refletem aquilo que emanamos, nos devolvendo aquilo que a elas lançamos. Assim, tudo o que exalamos volta para nós, e potencializado.

Um sorriso é a própria semente que dá origem a outros sorrisos. E o mesmo se dá com a alegria, a gentileza e tantas outras coisas.

Para termos o que quisermos em nossas vidas, basta que o plantemos nas vidas daqueles que nos rodeiam. Agindo assim, naturalmente, teremos para nós de forma multiplicada tudo o que espalhamos. Espalhe gentileza e será tratado gentilmente. Seja educado e será tratado com educação. Ame e será amado.

O segredo do amor é este tão simples: para ser amado, basta ser amável. Simples, verdadeiro.

Alastre bons sentimentos e os terá de volta. Essa é uma regra de tamanha simplicidade que tende a ser ignorada. Às coisas simples em geral não é dada a devida importância. Muitas vezes, porém, por serem tantas as mudanças que queremos promover em nossas vidas, não sabemos por onde começar. Comecemos pelo simples, pelo pequeno e, com persistência, algo maior se realizará.

Um sonho, uma lembrança

Envolvida pelo som de uma canção celestial, caiu em sono profundo. O tênue sorriso conferia-lhe um semblante angelical, como se sua alma tivesse sido levada para as mais sublimes esferas de paz e harmonia. E de fato havia sido.

Assim que os olhos de seu corpo de matéria cerraram-se ao embalo da música, os olhos de sua alma abriram-se diante de um lugar magnífico e resplandecente. Tudo era brilhante, belo e majestoso. Todos os objetos eram reluzentes e harmônicos. Nada era menos do que perfeito.

A jovem, que agora vestia um longo vestido perolado, enfeitado por delicadas pedras cintilantes, deparou-se com um local que não imaginava poder existir. Ao mesmo tempo, porém, a sensação de familiaridade era viva em seu coração.

A relva era prateada, com uma leve tonalidade de azul claro; espargia dela um brilho cintilante. Tudo, aliás, era cintilante. Pouco adiante havia um palacete, cujo pórtico de entrada era imenso e de onde emanava um brilho ainda mais intenso do que o do restante da paisagem.

Como se já conhecesse tudo ali, dirigiu-se à entrada do palacete e a atravessou.

Do outro lado, uma multidão de pessoas estava reunida em pé num semi-círculo, esperando por ela. Sem pestanejar, a garota correu para os braços daquele que parecia ser o senhor do palacete. Foi carinhosamente abraçada e, depois do caloroso abraço e do choro de emoção, afastou-se um pouco. Permaneceram com as duas mãos dadas e os olhares fixos um no outro, ao que o homem lhe disse:

– Minha filha, querida. A emoção desse instante que a tenho diante de mim é maior do que a saudade das longas eras que passamos distantes; saudade essa que não foi pouca. Saiba que este é teu lar e que as portas estarão sempre abertas esperando por ti. Tua presença enche a mim e a todos aqui de alegria. E estamos ansiosos para tê-la conosco novamente. Guarde, onde quer que vá, a lembrança deste momento. E não te esqueças dele jamais, pois aqui é o teu lugar. E aqui estão muitos daqueles que te amam com o amor verdadeiro, que perdura por todo o tempo e distância.

Enquanto falava, todos ao redor curvaram-se respeitosamente, virados com os semblantes emocionados em direção de pai e filha.

Mas algo despertara seu corpo de matéria e aquele momento mágico que gostaria que durasse para sempre dera lugar à vista com que estava acostumada: os raios de sol penetrando pela janela e iluminando as mobílias de seu quarto.

Tudo que lhe era comum parecia agora tão surreal. Parecia ter lembrado de algo que jamais deveria ter esquecido e, mesmo com estranheza, guardara dentro de si a certeza de que seu sonho não fora apenas um sonho e que, em algum lugar além das estrelas, havia algo que precisava buscar.