O herói do povo, num tempo em que os grandes feitos eram divulgados diretamente de bocas a ouvidos, e em que notícias confundiam-se com boatos, estava a passear em meio à plebe, para conhecer de perto aqueles por quem lutava.
Era de fato um grande homem, de inquestionável integridade e nobreza de espírito. Uma alma verdadeiramente generosa, além de uma mente notavelmente sagaz.
Mas, como eu ia dizendo, nosso herói resolveu dar um passeio junto ao povo, aproveitando-se do anonimato de que ainda podia usufruir. Seu rosto ainda era desconhecido, apesar de não haver uma só alma que não tivesse conhecimento de suas nobres ações.
Em meio à sua andança, deparou-se com um velho, que estava a resmungar em frente a uma cabana antiga e mal cuidada, com um pedaço de pau na mão – usado para espantar os cães vira-latas de sua frente –, quando dele aproximou-se o Herói que, procurando identificar os motivos das reclamações do velho, para que talvez pudesse ajudá-lo, indagou:
– Com licença, senhor. Posso saber o que o aflige? Talvez possa ajudá-lo.
– O que me aflige? Ora, que pergunta tola! Não vê que sou um velho, fraco e sozinho?
– A velhice é capaz de atingir o corpo, mas não a alma. A força ou a fraqueza dependem exclusivamente de nós mesmos e a solidão, nada mais é do que um estado de espírito. Não quero, contudo, dizer que não tenhas motivos para sentir-se desolado, mas quero sim lembrar-lhe que, com toda certeza, tens de quê se orgulhar e ser grato.
– Ora, quem pensa que é? Não bastasse todo sofrimento que já possuo, ainda tenho que agüentar um jovem petulante me importunando?
– Desculpe, senhor. Minha intenção é ajudá-lo; minhas palavras são proferidas na esperança de que lhe sejam úteis.
– Palavras, de quê elas adiantam? Todos dizem ter boas intenções, mas sei que está aqui com o intuito de tirar-me a paz, zombando de meu sofrimento. Se tivesse boas intenções, deveria fazer como o grande Herói de que todos falam, aquele que luta com bravura para melhorar as condições de nosso povo. Ele sim é um homem digno de honra e glória e não um rapazote como você que vem aqui tirar a tranqüilidade de um velho.